sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Soluços do corpo - "Panorama Literário Brasileiro: contos"

Amanheci grávida. Uma felicidade clandestina, doce e obstinada, segue sem atropelos através da manhã de março. Recordo-me do dia anterior e sinto que, mais uma vez, você flutua no meu hálito quente. A imagem do menino vadio e sua voz de leite e mel promovem o meu delírio em lento vôo.
Estranha lucidez a minha... Meu coração é conhecedor de sua liberdade: seu coração não pode ter uma só dona, você é diversos e intensos amores. Mas o seu sopro de sedução invade as minhas veias descontroladamente e diante do seu encanto único e experiente, tombo em seus braços. Se você quer: fico, queimo a razão e a consciência.
Na brisa da lembrança, vislumbro as linhas do seu corpo, ouço o arfar do peito e seu olhar calmo convida para desejar o ritmo que você deseja. São momentos singulares e febris. O seu desejo é começo e tropeço, é fogo e armadilha, sua boca vermelha entreaberta é a grande cilada que laça, prende e sufoca. E na prisão dos seus abraços emerge a fome atroz da sexualidade, é o prazer que desejo e possuo.
Nessa noite de quem sonha amor travesso, na loucura dos primeiros e quentes momentos, você balbucia coisas sem nexo que se transformam em extasiantes ondas de calor. É uma urgência que encosta, desliza e alisa meu corpo entregue e cheio de espera. São emoções imprevisíveis de um sonho antes disperso agora enrijecido e latejante. Há reciprocidade nos olhos suplicantes de desejo e num incrível devaneio aceitei ser a eleita, a favorita. Havia orgulho e pudor em mim. Timidamente senti com intensidade você me cobrir com suas carícias lentas, com perícia suas mãos tateavam meu corpo como arma poderosa: liberdade, encanto e comando. Ainda ecoa forte em mim sua voz murmurando:
_ Vem...Liberte os versos e a poesia...
No descontrole que não busquei, sinto que caí na armadilha do imprevisível: estou impotente e à deriva. No meu corpo sensações indescritíveis e efeitos alucinantes. Seus dedos atrevidos buscam amor urgente e provocam suspiros e murmúrios. Sua boca abriga os meus seios com uma língua afinada e afiada. Não consigo libertar os versos e a poesia com a minha própria voz, assim uso gestos para que você os liberte. Sacio os meus lábios na pele de todo o seu corpo que espera por mim, e com beijos suaves e ardentes, arranco gemidos abafados em compassos ritmados e íntimos: marcas de paixão e explosão. Desfalecemos... transcendemos ... Os corpos entrelaçados se fundem, somos seiva e alívio, úmidos e afogados na belíssima luta de corpos nos lençóis revoltos. Somos dois de desejo, outrora sucumbidos, agora embebidos e embriagados nos soluços do corpo.

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