sábado, 9 de junho de 2012

O grito


Com o grito assustado

Vejo seus olhos impermeáveis

Sou vítima dos meus desejos

E dos meus silêncios...

Não há doçura no sorriso sufocado

Só minhas lágrimas amargas e rígidas

Sou alvo morto

Oferto um beijo pra essa boca de miséria

Encolho-me num canto e encanto

Ensejo não desejar

Uma pequena letra

Que gosta de aparecer

Tão pequena...

Feliz com a mentira na boca

E com as presas afiadas da vida

Morro e mato a cada dia

O louco dentro de mim

E no fragmentado do vivido

Sou coisa alguma do nada

Nas minhas intensas maneiras de sentir

Sem penas é apenas a pena

De sentir o fio da solidão nas bocas do outro

Uma mentira que consome

a fome do poema no poema

Ecos esquecidos e partidos

É o isso e/ou aquilo

Corridos em linguagem

Umedecida e escorrida

Nas paredes embrutecidas da alma

Num incessante repetir e refazer

Na mesma dor de doer dolorida

Busco e preciso de um cânone

Como uma aranha que começa a tecelar

É o espiar, o repetir e o construir

Livrar-se de si e encher-se do outro

Poema meu poema nosso

Brotando como fonte de água

É a lógica dos paradoxos

Das construções imaginárias

Sem medo de invasão

Um sentir sem compreender

Intangibilidade...

CHUVA PASSANTE

Sou passante no sol da poesia

É pura subjetividade no lamaçal dos janeiros

E na pequenez da existência comum

Há paixão para transbordar a vida.

A simplicidade oferece algo mágico

A chuva murmura o seu nome

Enquanto o mar leva a forma e o rosto

Emerge diferente para os olhos da alma.

Meu coração está preso nas brumas rosadas

Aromas florais perambulam livres

Ramos verdes espreguiçam-se nos seios da relva

A água lambe os calcanhares na casa das sereias.

E na chuva salgada saboreio o Amigo Amor Amável

Corpo de mel e sentido latejante num vento que arrepia

Zunir poético na maciez da rosa sem espinhos

Cascata que lava e leva o calor das águas de março

Um céu sem tempestade: santuário da reflexão

Ter ouvidos para o silêncio

Ter olhos para o invisível

Leveza e sinestesia da felicidade humana

Deliro... Natural e feliz: Isso é tudo.

PADECER


A cegueira da razão não nos permite ver

A lã vermelha que fiamos nossos sonhos,

Os vidrilhos esparramados pela mesa

Que enfeitam e constroem os bordados da vida.

Tateamos apenas insignificantes nuances

Do que dizem amor.

É o amar que se ama sofrendo e se sofre amando...

Os bolsos internos dos nossos desejos

Estão recheados de medos e ansiedades.

Exaustivo é esconder os fantasmas

Que nos obrigam a olhar no espelho

A fim de contemplar nosso próprio padecer.

Entre precipícios e infernos

Perseguimos a subjetividade que nos escorre pelos dedos.

Tentamos relembrar as zonas submersas da alma

E não há umidades, só há ocultamento.

Amor, sujeito indeterminado.

Nossa recusa insana busca a margem da margem,

Prática desnaturada e incômoda... o ser diferente.

A objetividade impõe-se imprescindível e

O lócus do desatino social, não tem fundo,

E se aprofunda tornando-nos impotentes, infelizes.

Amor, sujeito elíptico...

Amassamos as emoções já disformes e sem vida

Desgastamos e destruímos qualquer fonte de prazer.

Amor, sujeito inexistente...

O amor tem a propriedade de viver em trânsito

E simplesmente transita no devaneio da morte,

Da morte do sentimento perecível e mutável.

Amor, sujeito da emoção e sujeito à razão.

Enigma do viver amor.